domingo, 9 de outubro de 2011

SOCIEDADE DE CONSUMO E SOCIEDADE DE RISCO
Notas acerca da responsabilidade pelo fato do produto e pelo vício do produto
no âmbito do Código de Defesa do Consumidor.

José Marciano Monteiro[1]


O presente trabalho parte de uma discussão acerca da instauração e construção histórica da sociedade de consumo e sociedade de risco.  Dentro desse contexto, inserir-se-á a problemática acerca da responsabilidade pelo fato do produto e pelo vício do produto. Trata-se, tão somente, de uma abordagem que se pretende não finalizar a discussão, mas apresentá-la. Uma abordagem que, metodologicamente, se operacionaliza através de uma pesquisa exploratório-bibliográfica, posto que se explorou textos e referências acerca da problemática já mencionada. Abordar-se-á, desta feita, a responsabilidade pelo fato do produto e pelo vício do produto numa perspectiva que tem como centro da análise a sociedade contemporânea, caracterizada pelo consumo e pelo risco. Para tanto, tem-se como considerações importantes que o Direito, avançou no sentido de adotar a responsabilidade objetiva dos fornecedores de produtos, bem como tem garantido minimamente, através do “Código de Defesa do Consumidor”, numa sociedade permeada por mercadorias, o respeito à dignidade, saúde e segurança do consumidor.

PALAVRAS-CHAVE: Sociedade. Consumo. Risco. Responsabilidade

            A história tem nos apresentado que profundas são as transformações realizadas pelo homem no decorrer da sua trajetória. Transformações estas que se deu não a partir da sua maneira de olhar e conceber o que estava ao seu entorno, mas das relações que o homem estabeleceu, no decorrer da história, com a natureza e com a sua própria espécie. O homem ao transformar a natureza através do trabalho modificou-a. Ao modificá-la, criou e cria, cotidianamente, novas necessidades, as quais muitas das vezes são supérfluas e se apresentam como se necessárias fossem para a existência do humano na terra.
              As transformações tratam-se das relações sociais estabelecidas e mediadas pelo trabalho. Isto não é algo que tem ocorrido recentemente. Tem-se ocorrido desde os primórdios. No entanto, o que se tem percebido é que a relação do homem mediada pelo trabalho tem se intensificado principalmente a partir da I Revolução Industrial e, mais ainda, no momento atual em que se vivencia modificações profundas no processo de produção, circulação e, conseqüentemente, consumo de bens.
A fase em que hoje a sociedade passa a vivenciar não diz respeito mais as transformações existentes no período da I Revolução Industrial, posto que, posteriormente, a essas duas já se sucederam. Se a primeira tinha como motor propulsor de transformação a máquina a vapor, a segunda já apresentava a eletricidade e a química, como elementos de transformação; a terceira, ultrapassando e superando a eletricidade e a química, atrela-se a mais um elemento novo – as tecnologias da informação – iniciadas no vale do silício, através de elementos eletro-eletrônicos, tais como capacitor e circuito integrado, que propiciaram a construção do computador e, conseqüentemente, as profundas transformações que se tem instauradas pela III Revolução Técnico-informacional ditada pela robótica, telecomunições e a engenharia genética.
Essas transformações que estão ocorrendo junto às sociedades contemporâneas não dizem respeito tão somente à dimensão técnico-científicas, mas, muito além, posto que se trata de transformações que estão diretamente vinculada ao modo comportamental dos indivíduos em sociedade. Trata-se de uma transformação que implanta um novo modo de produzir dos humanos, permeados por máquinas e pela técnica, bem como uma nova relação que o humano estabelece com o consumo das mercadorias, que deixam de ser tão somente materiais e passam a ser simbólicas.
A mídia, enquanto produto do humano, com todo o seu aparato técnico, passa a orientar e, conseqüentemente, informar o que o ser humano deve consumir. As imagens veiculadas pelos meios de comunicação (TV, internet, dentre outros) têm alterado profundamente a relação que o homem estabelecia no inicio da sociedade moderna industrial com as mercadorias, e o que hoje ele estabelece. A mídia, portanto, torna-se um sistema todo integrado no qual o homem também se encontra inserido. E ao estar inserido nesse sistema, ele se se insere numa lógica permeada e realçada por aquilo que Adorno (1985) denominou de indústria cultural.
O que se observa, nessa contemporaneidade, é que não se trata mais tão somente de uma sociedade industrial, aos moldes da concepção atribuída em meados do século XIX. Trata-se de uma sociedade moderna industrial extremamente complexa. Há quem considere a sociedade atual permeada por uma modernidade que se caracteriza pela reflexividade (Giddens, Beck e Lash, 1997), outros pela informação (Castells, 2007). Bem como, vasta é a literatura sociológica que aborda o atual estágio do capital como constitutivo de uma nova lógica produtiva que não se instaura em uma dinâmica restrita ao lócus nacional, mas sim se expandindo em dimensões globais.
O que se observa, nesse sentido, é que as transformações se dão no âmbito de uma sociedade em que a economia se internacionalizou, os contatos com novas culturas também passaram a ser central no âmbito das mudanças. E, consequentemente, o modo dos indivíduos se relacionarem um com o outro dentro de uma sociedade que implanta um metabolismo de destruição criativa, que cria produtos constantemente novos, e que instaura a obsoletização planejada como uma característica fundamental para o aumento do consumo.   Trata-se, portanto, com todas essas transformações que vem ocorrendo no âmbito do conhecimento, da informação, da internacionalização do capital, da globalização, de uma sociedade em que o consumo se tornou central (Bauman, 2008; Baudrillard, 2009), mas não somente o ato de consumir, mas atrelado a isso surgiu também a sociedade de risco (Beck, 2010).
O Direito, nesses termos, assume, nas sociedades modernas, papel central na mediação entre os indivíduos e suas relações, tanto com os outros indivíduos, como com os objetos. O direito passa a ser nas sociedades moderno-contemporâneas, o mediador, das relações entre os indivíduos, numa tentativa de resguardar a dignidade da pessoa humana, posto que tudo, nessa sociedade de consumo, tende a se tornar em mercadoria, ou seja, objeto de consumo, com valor de troca e valor de uso. Nesse aspecto, necessário se faz à proteção por parte do estado às relações estabelecidas pelo humano quer seja com os objetos para seu uso quer seja com os próprios humanos.
Por se tratar de uma sociedade em que o processo de industrialização se intensificou profundamente e, por assim dizer, o processo de produção de bens e o aumento do consumo, criou-se a necessidade, por parte do Direito, de resguarda e proteger o humano através de uma legislação específica. Diga-se de passagem, uma proteção que diz respeito ao humano inserido no mercado na condição de consumidor.
No Brasil, por exemplo, tem-se toda uma legislação própria e exclusiva, para não dizer específica, que trata desse novo atributo do humano na sociedade de consumo. Ou seja, o ser humano enquanto consumidor. A necessidade de se pensar, mas não só pensar, mas de positivar no ordenamento jurídico brasileiro já se apresentava na década de 80. Digo isto pelo fato que, nesse período, no Brasil, começava a se consolidar uma sociedade de massa (Adorno, 1985) na qual a necessidade de ter uma legislação específica se colocava na ordem do dia.
A partir da constituição de 1988, não há simplesmente uma recomendação quando ao consumidor, mas “uma ordem” um imperativo no qual “o Estado promoverá a defesa do consumidor”. Logo foi “o constituinte originário que instituiu um direito subjetivo público geral a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país, para que o Estado-Juiz e o Estado-Executivo, na forma da lei realizassem a defesa do consumidor”. (CAVALIERI FILHO, 2010, p. 11)
Ainda Cavalieri (2009) nos afirma que a defesa do consumidor encontra também embasamento em outros dispositivos constitucionais, nos princípios gerais da ordem econômica equiparando-se e estando no mesmo status que os princípios da soberania nacional, da propriedade privada e da livre concorrência. Tamanha importância assume o consumidor na sociedade contemporânea, posto que o mesmo sem essa proteção que se estabelece através do Código de Defesa do Consumidor – CDC, estaria completamente vulnerável no contexto da sociedade de risco. E nesse sentido, se pode afirmar que o CDC “veio à lume apenas para atualizar a legislação até então existente, mas sim para criar um novo direito. [...] Temos um novo direito para as relações de consumo e, como tal, com campo de aplicação próprio, objeto próprio e princípios próprios” (Idem, 2010, p. 13)
No contexto da sociedade de consumo observa-se que as relações de consumo estão presentes no cotidiano de todas as pessoas, já que “um mercado massificado coloca a disposição inúmeros produtos e serviços ao consumidor que, devido a evolução tecnológica e cultural do País, substituiu a economia de subsistência por uma sociedade de consumo, conforme mencionado. Nesse sentido, a sobrevivência dos indivíduos, nesse estágio do capital, perpassa pela necessária compra de produtos para o consumo.
  Dessa feita, a partir do CDC temos o entendimento de Consumidor (Art.. 2º) como sendo “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. Esse conceito tem caráter exclusivamente econômico, já que considera apenas o indivíduo que no mercado de consumo adquire ou utiliza produtos e serviços com vistas a satisfazer suas necessidades e não com interesse em desenvolver atividade negocial. Inovando, o código considera-se consumidor tanto a pessoa natural quanto à pessoa jurídica.
Numa tentativa de juridicamente proteger a parte mais “fraca” das relação consumistas, o CDC tratou de abordar a responsabilidade civil das relações de consumo.  Nestes termos, discorre sobre a responsabilidade pelo farto do produto, responsabilidade pelo vício do produto e pelo serviço do produto. Aqui trataremos apenas das duas primeiras.
O que se nota é que antes do CDC não se havia legislação eficiente para enfrentar a problemática dos acidentes de consumo e proteger os consumidores. Esses eram extremamente vulneráveis, posto que
“os riscos de consumo corriam por conta do consumidor, porquanto o fornecedor só respondia no caso de dolo ou culpa, cuja prova era praticamente impossível. O código do consumidor deu uma guinada de 180 graus na disciplina jurídica até então existente na medida em que transferiu os riscos do consumo do consumidor para o fornecedor” (Idem, 2010, p. 264)
O que se observa é que conforme, Cavaliere e mais precisamente o CDC  nos arts. 12 a 14, o legislador ao discorrer no art. 12º que respondem independentemente de culpa “o fabricante, o fornecedor, produtor e o importador pela reparação dos danos causados ao consumidor, adota no código a responsabilidade objetiva. E como observou-se, excluiu o comerciante, o qual será responsabilizado em via secundária, já que sua responsabilidade é subsidiária, conforme salienta o art. 13º.
Quanto aos “defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos” (art.12º) a doutrina costuma dividi-los em três modalidades.
Primeira modalidade: tem-se o chamado defeito de concepção ou criação, nesse caso os vícios podem ser resultantes de erro no projeto, ou por uso de produtos inadequados ou nocivos à saúde. O defeito[2] atinge todos os produtos da mesma série, podendo se ter como exemplo o caso dos medicamentos defeituosos que são retirados do mercado de consumo. Conclui-se, portanto, na aceitação por parte dos fabricantes, da teoria do risco criado.
Segunda modalidade: estão os defeitos de produção ou de fabricação que resultam de falhas, mecânica ou manual, no processo produtivo e assinalam sua inviabilidade. Os vícios aparecem em alguns exemplares refletindo o controle de qualidade dos produtos.
Por último, terceira modalidade, os defeitos de informação ou de comercialização, os quais decorrem de informações vinculadas ao produto que são inadequadas ou insuficientes sobre sua utilização e riscos.
As duas primeiras categorias de vícios[3] configuram os defeitos intrínsecos e a última os vícios extrínsecos, tendo em vista que estas dizem respeito às informações que acompanham o produto, externamente, como os rótulos, bulas, embalagens, publicidade, etc.
Há que se ressalvar, como bem assevera o Cavalieri (2010, p. 271) que embora
“a perigosidade seja um elemento ligado ao defeito, o CDC não proibiu nem sancionou a circulação de produtos perigosos, pelo contrário, admitiu a sua existência e a sua normal fabricação, pela singela razão de que muitos dos bens colocados no mercado para satisfazer as necessidades sociais oferecem em maior ou menor grau, um certo grau de perigosidade”.     
A periculosidade não pode ser entendida como um defeito do produto, posto que se assim fosse todo produto perigoso não seria passível de estar circulando na sociedade contemporânea. E a mesma fabrica em grande escala produtos de alta periculosidade, a exemplo de armas de fogo e agrotóxico.
Destaca-se que existe uma distinção entre produtos com perigosidade inerente e perigosidade adquirida. Com relação ao primeiro, podemos destacar exemplificando um medicamento com contraindicação  ou agrotóxico, nesse há normalidade e previsibilidade e pode ter um defeito que esteja relacionado a comercialização por informação deficiente. Em relação ao segundo, risco adquirido, se dá quando produto se torna perigoso em decorrência de um defeito. Neste caso, o que se tem é, o contrário do primeiro, imprevisibilidade e anormalidade.
Os riscos inerentes criam, desta feita, para o fornecedor, outro dever jurídico, que é o de informar. Cavaliere (2010, p. 272) nos destaca que
O dever de informar [...] serve de fundamento para a responsabilidade do fornecedor, cuja violação pode levá-lo a ter que responder pelos riscos inerentes, não por defeito de segurança do produto ou do serviço, mas por informações inadequadas ou insuficientes sobre a utilização ou os riscos do produto. Nesse caso, a responsabilidade não decorre do defeito do produto ou do serviço, mas da ilicitude na conduta do fornecedor que descumpre com o dever de informar. ( Grifos do autor)
Além do risco inerente e do risco adquirido, alguns autores destacam o risco exagerado, que se consubstancia em um risco inerente mais grave. São aqueles produtos que apresentam periculosidade inerente à saúde e segurança do consumidor. A esses Cavaliere (2010, p. 273) aponta-nos que cabe ao “Poder Público, com auxílio técnico, impedir a comercialização de produtos de risco exagerado, ou retirá-los de circulação tão logo seja apurada essa periculosidade”
Como se tem abordado, a responsabilidade pelo fato do produto tem por fato gerador o defeito. Este, como já mencionado, se caracteriza por vício grave, posto que compromete a segurança do produto e causa dano ao consumidor. Diferentemente, e notório se faz, do vício, que é um defeito menos grave e se circunscreve ao produto. Logo, todo defeito traz consigo o vício, porém o contrário não é verdadeiro, ou seja, o vício não traz consigo o defeito, posto que o vício não atinge o consumidor.   
Embora o vício não atinja o consumidor diretamente como o faz o defeito, O art. 23 do CDC reforça a responsabilidade objetiva do fornecedor ao dispor que “a ignorância do fornecedor sobre os vícios de qualidade por inadequação dos produtos e serviços não o exime da responsabilidade”.
A responsabilidade pelo vício do produto, diferentemente da responsabilidade pelo fato, se caracteriza pelo fato de que há responsabilidade solidária entre todos os fornecedores, inclusive o comerciante (CAVALIERI FILHO, 2010). Isto torna-se verificável e notório a partir do que está disposto no art. 18 do CDC “os fornecedores de produtos de consumo duráveis e não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que nos tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam”, bem como salienta, no mesmo, sentido, o art. 19 “Os fornecedores respondem solidariamente pelos vícios de qualidade dos produto [...]. E, prosseguindo, Cavaliere (2010, p. 296) destaca que a
A solidariedade só se rompe nas hipóteses dos arts. 18 § 5º, e 19, § 2º. A primeira trata de produto in natura, isto é, colocado no mercado de consumo sem passar por qualquer processo de industrialização, caso em que o responsável perante o consumidor será só o fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente o produtor. Responde, também, somente o fornecedor imediato na segunda hipótese – vício de quantidade decorrente de produtos pesados ou medidos na presença do consumidor – se o instrumento utilizado (balança etc.) não estiver aferido segundo os padrões oficiais.
            O vício de qualidade diz respeito aqueles produtos que se tornam impróprios ao consumo. O CDC, em seu art. 18, estabeleceu um novo dever jurídico para o fornecedor, qual seja, o dever de qualidade. Cabendo-lhe agora inserir no mercado produtos satisfatoriamente adequados ao consumo (CAVALIERI, 2010). Ocorrendo o contrário, ou seja, estando o produto, por exemplo, estragado, ao consumidor cabe o direito de ser ressarcido segundo prescreve os incisos I- III do § 1º do art. 18 do CDC. Não sendo sanado o vício num prazo de 30 dias pedra exigir: “I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III – o arbitramento proporcional do preço.   (Idem, 2010, p. 297-298)
Sintetizando e conforme Cavalieri (2010) percebe-se que são considerados vícios as características de qualidade e quantidade que tornem os produtos ou serviços impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam e também que lhes diminuam o valor. Da mesma forma são considerados vícios os decorrentes da disparidade havida em relação às indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem, oferta ou mensagem publicitária. (Rizzatto Nunes, p. 162). O defeito pressupõe o vício. Há vício sem defeito, mas não há defeito sem vício. O vício é uma característica inerente, intrínseca do produto ou serviço em si.  (idem, p. 163). O defeito por sua vez é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa extrínseca ao produto ou serviço, que causa um dano maior que simplesmente o mau funcionamento. O defeito causa, além desse dano do vício, outro ou outros danos ao patrimônio jurídico material e ou moral do consumidor. (idem, p. 163). O consumidor, através do defeito do produto ou serviço é atingido extrinsecamente. 
Diante do exposto, poste-se inferir que o CDC trouxe consigo a responsabilidade civil não mais no âmbito de uma responsabilidade subjetiva, mas de uma responsabilidade objetiva. Tendo em vista que vivemos em uma sociedade de risco (Beck, 2010) e, nesse sentido, o foco deixa de ser o sujeito e passa a ser o objeto, o produto. Logo, o Código de Defesa do Consumidor, se instaura num rol de discussão que tem como pretensão reparar os danos causados aos consumidores que muitas vezes tinham seus interesses de reparação frustrados devido ao fato de em muitos casos a prova da culpa do fornecedor ser inviável para eles.
A adoção da responsabilidade objetiva dos fornecedores de produtos e serviços e a conseqüente tutela do consumidor vulnerável têm a finalidade de incentivar a qualificação dos bens e serviços postos no mercado de consumo, bem como garantir o respeito à dignidade, saúde e segurança do público consumidor. O Código, portanto, é um micro sistema que possibilita algumas garantias que são fundamentais para os indivíduos que estão situados em um contexto de sociedades de massa, nas quais o risco perpassa todo momento às vidas dos consumidores, tornando-os ainda mais frágeis e vulneráveis diante de uma sociedade permeada pelo consumo e pela reificação da vida.  


Referências Bibliográficas

ADORNO, Theodor W. A indústria cultural: o esclarecimento como mistificação das massas. In: Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Zahar, 1985.
BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de Consumo. Lisboa: Edições 70, 2009.
BAUMAN, Zygmunt.  Vida para consumo: a transformação de pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2008.
BECK, Ulrich. Primeira parte: No vulcão civilizatório: os contornos da sociedade de Risco. In: Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: Ed. 34, 2010.
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede V. 1. 10ª Ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2007.
CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Direito do Consumidor. 2ª Ed. São Paulo: Editora Atlas, 2010.
GIDDENS, Anhony; BECK, Ulrich; LASH, Scott. Modernização reflexive: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo, UNESP, 1997.
NUNES, Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
VADE MECUM COMPACTO DE DIREITO RIDEEL.  2 ª Ed. – São Paulo: Rideel, 2011.
VENOSA, Sílvio de Salvo, Responsabilidade Civil. 2.ed. São Paulo: Atlas S., 2002.


[1] Bacharelando em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. Graduado em Filosofia pela UEPB e Bacharelado e Mestrado em Ciências Sociais pela UFCG. Professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido – CDSA – da Universidade Federal de campina Grande – UFCG.  
[2] Cf. Cavalieri (2010, p. 267) o Código de Defesa do consumidor diz que o produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera. Do ponto de vista legal, portanto, produto defeituoso é aquele que não oferece segurança legitimamente esperada ou esperável. 
[3] Cf. Cavalieri (2010) se por um lado o defeito se caracteriza por comprometer a segurança do produto ou serviço, o vício se configura como defeito menos grave, circunscrito ao produto ou serviço em si; um defeito que lhe é próprio e que apenas lhe causa um mal funcionamento ou não funciona, mas que não atinge outros seres. 

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

LAURA

A divindade em seus mistérios se fazia
revelando-se, ao casal, os encantos
da vida que muitas vezes aos prantos
pedia, no jardim, luz para iluminar o dia

como se essa fosse de escuridão vazia
e que nada plantaria  - somente acantos
não percebendo que, nos cantos, os cantos
brotariam como flor, arbusto, terapia...

a flor que nesse jardim - plantaria
não era flor do Lácio e nem acanto
mas, sim, o canto de encontros da alegria

que na forma consagrada se prazia
como arbusto louro, Laura e encanto
da vitória, do amor, construído a cada dia

José Marciano Monteiro

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Corrupção: virtude ou crime na sociedade brasileira?


A sociedade brasileira assiste diuturnamente a processos de espetacularização dos atos vinculados à corrupção. Tem se tornado comum e, muitas vezes, “normal”, atores envolvidos com a ordem pública (senadores, deputados, ministros, entre outros), desviar recursos públicos para fins privados, e a punição que se tem, para tais atitudes desviantes e criminosas é tão somente o afastamento desses atores dos seus cargos e a abertura de inquéritos investigativos que, na maioria das vezes, quando saem da cena da grande mídia, não se chega a nada, acabando-se, portanto, em pizza
Por outro lado, pode-se afirmar, também, que no Brasil, historicamente, a corrupção, para além dessa atitude criminosa, tem se configurada como uma virtude (ou como nos diria Aristóteles, uma excelência moral), posto que, aquele que consegue desviar milhões em recursos públicos para o seu benefício, para finalidades pessoais e particularistas, e não é enquadrado como criminoso, é entendido como o “inteligente”, e o que é a inteligência senão uma excelência moral, uma virtude.
Há, assim, uma verdadeira confusão no imaginário da sociedade brasileira no tocante ao entendimento do que venha a ser crime e o que seja virtude. A corrupção encontra-se nessa dubiedade. É comum e notório ouvirmos pessoas afirmando que aquele que desviou muitos recursos de órgãos públicos, os quais seriam destinados para melhorias na educação e na saúde, e não fora pego pelo aparato investigativo e repressivo do Estado, são “inteligentes”, são os “espertos”, são os “malandros”. Percebe-se que o que existe é uma verdadeira confusão, no cotidiano moral da sociedade brasileira, sobre o que é uma atitude virtuosa e uma atitude criminosa.  Desta feita, ao adjetivar o corrupto de “inteligente”, ocorre uma inversão de valores que se constitui numa inversão de entendimento, bem como uma inversão da realidade, posto que se passa a entender o não-corrupto (honesto) como um ser não-inteligente, popularmente conhecido no Brasil como um “besta”.
Essa “moralização” da corrupção estava tão absurda que necessário se fez, por parte do Estado e a partir da iniciativa popular da sociedade civil organizada, construir uma lei que pudesse normatizar (positivar) o comportamento honesto dos representantes do povo. Ou seja, se não fosse esta inversão moral histórica existente na sociedade brasileira acerca da corrupção, que é entendida mais como uma virtude que propriamente um crime (posto que muitas vezes não deixa rastro), não se teria necessidade em positivar, no ordenamento jurídico brasileiro, a Lei do “Ficha Limpa” como condição a cargos eletivos.
Dito isto, o que se observa é que a corrupção no Brasil não é algo inerente a classe política deste país tão somente, mas que se mantêm vinculada a um enraizamento cultural que tem feito com que a maioria das pessoas a entendam como um fenômeno natural e até típico do ser brasileiro. Não se tem percebido, no entanto, que a corrupção é produzida histórica e “moralmente” pelos próprios atores sociais. Para tanto, não é a dureza da lei por si só que modificará o comportamento dos atores políticos, mas sim o rigor da execução da lei que fará com que os atores tenham comportamentos condizentes com os princípios e a ordem pública constitucional, para isso precisa-se de instituições investigativas e repressivas consolidadas e uma população que entenda a corrupção não como sinônimo de “inteligência”, mas como prática nefasta e criminosa que tem contribuído para a não melhoria na educação, saúde, infra-estrutura e segurança nesse país.       

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Morre o homem que mais fez por Queimadas: Saulo Ernesto.

Hoje Queimadas acordou sentindo falta de um dos seus filhos. Filho que muito lhe honrou. Partiu-se o homem, o político, o pai, o amigo, o desportista, ficaram-nos os exemplos. Exemplo de pessoa humana que dignamente conduziu os destinos do município de Queimadas, por duas vezes, em 1976 e em 2004. 
Saulo Ernesto deixa o exemplo de que para servir ao público faz necessário ter espírito público; ter espírito democrático, ouvir as múltiplas vozes, ser/estar, acima de tudo, republicano, agindo de forma respeitosa, sem encarar a arena política como o espaço dos "inimigos", entendendo que esta é o espaço das diversidades as quais tem todo o direito de expressarem as suas vontades, os seus anseios, os seus desejos. 
Queimadas, nesse sentido, perde o homem que mais fez por essa terra. O homem que construiu as maiores obras existentes no município. O velhinho trabalhador, como muitos, assim, respeitosamente, o denominavam,  que construiu desde as obras de saneamento ambiental até as obras de referência na saúde e no esporte do município, sem mencionar que foi Saulo Ernesto o idealizador do São João de Queimadas, da Renovação da Festa de Reis, do Festival da Fava, do Projeto Kiriris, da Banda Filarmônica,  da efetivação dos Agentes de Combate as Endemias e Agentes de Saúde, em geral; da valorização dos Profissionais da Educação; da implantação dos programas de ação social no município, a exemplo do PETI, PAIF, Agente Jovem; do estímulo ao pequeno agricultor com a implantação do Programa Compra Direta; do Distrito Industrial; da Maternidade (que destruíram); da Unidade Mista;  do Colégio Carlos Ernesto; do Estádio de Futebol; da Rodoviária (que destruíram); da Sociedade Esportiva Queimadense, do Plano Diretor, entre outras. 
Saulo deixa, enquanto homem público, além dessas referências materiais, o exemplo republicano de que as obras construídas pelos seus antecessores devem não só serem preservadas, mas também ampliadas, contrariando, assim, o costume e a cultura local, de muitos, que não deram historicamente continuidade às obras de seus antecessores. Queimadas perde um homem à frente do seu tempo, que agiu, muitas vezes, embora no passado, com práticas que devem nortear o nosso futuro, fundamentadas no espírito e na ética republicana.


José Marciano Monteiro
Professor da UFCG

domingo, 3 de julho de 2011

SONETO ANTROPOLÓGICO


Somos (formigas) de consciências
Possuímos culturas de diversas raças
Demonstramos os costumes nas (praças)
Com os referidos atos das crenças

Para que nós (formigas) tenhamos paciência
E os antropólogos estudem com graça
Não a definição do HOMEM, pois inexiste na ciência 
Mas o objeto em si desta raça

Esta raça, raça humana cultural.
Difícil de descobrir resposta universal
Excluindo o biológico e a biologia

Porém nem tudo que existe é natural
E o biológico independe do social
O HOMEM é objeto da antropologia

José Marciano Monteiro
11/02/2001

EM RESPOSTA AO POEMA “EU” DE FLORBELA ESPANCA


Se andaste perdida minha querida
No mundo, agora, te encontraste
E por ter a vida, com sorte, amaste
O (re) encontro com outra vida

Não és pessoa que se passa esquecida
Nem tens coração duro como desastre
És, entre o bem, o sempre bom contraste.
Que não se encontra em qualquer parti-da

És dialética entre o início e o fim
És bela flor de cravo e jasmim
Que és vista pelo perfume do querer

És, sim, fonte de inspiração pra mim
A florbela de meu lindo jardim
Que a cada manhã a vejo nascer.

José Marciano Monteiro
04/11/2006

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Um campinense (queimadense) esquecido?

Por Josemir Camilo[1]

Este texto foi construído pelo professor Josemir Camilo. Professor de História que mais uma vez, em um dos seus textos, não nos deixa passar despercebida a importância de um dos homens que mais contribuiu para a formação intelectual da sociedade campinense e, consequentemente, para a formação do pólo tecnológico que hoje Campina destaca ao se destacar.

“Agora em abril, comemoraram-se 31 anos que partiu um Quixote, não de La Mancha, mas de Queimadas, de Campina, da Paraíba: José Lopes de Andrade. Parece que na História da FURNE/UEPB esqueceram do lado mais pobre dos dois homens que a criaram. Ficou Edvaldo do Ó, com todo o mérito, mas falta Lopes. Se um parece ser o homem das ideias, o outro não é só de ideias, mas de por no papel, de organizá-las e os dois juntos refletirem. Segundo o próprio Edvaldo, Raimundo Asfora criticava a falta de densidade dos escritos edvaldianos. Foi Lopes quem rabiscou quase todas as ideias básicas para se criar a Escola de Comércio de Campina, a Faculdade de Ciências Econômicas, a Fundação de Ciência e Tecnologia (é, Campina já teve uma!) e a estrutura do que conhecemos hoje como UEPB.

Não sei, mas me parece meio nebuloso este silenciamento sobre o sociólogo. Autodidata, e só neste aspecto de sociólogo, e não genericamente como parecem ter entendido outros. É que a formação acadêmica de Lopes foi incompleta e em vários cursos acadêmicos(Direito, no Recife; Geografia e História na Paraíba e no Rio (mas não dá o curso). Tejo, aqui, se refere a dados colhidos de uma entrevista que Lopes dera a jornalista Jaldete Soares. Mais dados foram retratados por seu admirador, William Tejo, no Prefácio a Uma Militância na imprensa, organizado por José Octávio e Ana Maria Gonsalves (1985). Seria, no entanto, reconhecido como sociólogo, logo por quem? Por Gilberto Freyre que prefaciou o seu livro Introdução à Sociologia das Secas, editado no Rio de Janeiro em 1947.

A história da FURNE/UEPB tem que ser resgatada também nos documentos produzidos por Lopes que acompanhou toda a briga para a federalização daquela entidade ou de suas partes como ocorreu com a de Medicina. Interesses conflitantes de políticos, de administradores das faculdades isoladas de Campina e as sediadas em Areia, por exemplo, deixaram de federalizar a FURNe. Foi nos anos 80 que deveria ter surgido a UFCG, como uma fusão do Campus II, da UFPB e o da FURNe. Eu mesmo cheguei a escrever artigos dando pitaco sobre isto, se não me engano, como embarquei no final dos anos 90 na mesma luta de emancipação do campus II em UFCG.

Há que se produzir uma memória destes batalhadores anônimos que deram suas vidas em prol do desenvolvimento econômico e cultural de Campina Grande, por que sem esta memória, dificilmente haverá história recente. Já estava eu a pensar numa visita à família, para ver o que tem de documentos de Lopes, para a história da FURNE, quando sou informado por sua filha (ex-aluna) que a viúva Letícia Camboim faleceu no começo deste ano. Nada mais justo, portanto, esta curta homenagem ao acadêmico Lopes de Andrade”.

José Lopes de Andrade, um queimadense, um sociólogo, um intelectual. Um grande homem a frente do seu tempo que com grandes idéias e ações contribuiu para a construção de Campina Grande.


Ver:  http://www.paraibaonline.com.br/coluna.php?id=53&nome=Um%20campinense%20(queimadense)%20esquecido?




[1] PhD em História pela UFPE, professor aposentado da UFPB e professor visitante da UEPB.